quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Screaming Jay Hawkins

Screaming Jay Hawkins era um daqueles pugilistas que queria cantar ópera. O mundo do boxe está cheio de casos destes. Não é raro entrar num ginásio (para nos inscrevermos, não para nos entregarmos a exercícios físicos), chamar boxeur a alguém (no bom sentido) e ouvir: Sou um cantor de ópera, isto é provisório. Quantas vezes se ouve, nos ringues, entre dois assaltos, desabafos sentidos: "eu devia era ser cantor lírico". E que prazer dá vê-los retomar o combate com mais falsete no uppercut e um pequeno Puccini no jogo de pernas.
Voltemos a Screaming Jay Hawkins. Com o insucesso desta incursão pelo mundo da ópera, virou-se para o vudu e para os lamentos em pentâmetros jâmbicos e os doze (ou oito, sejamos complacentes com os números) compassos, ou seja, os blues. Fez muito bem. Isso e filhos. Fez cerca de setenta e cinco filhos a várias mulheres. Há rumores que afirmam ser um número menor, que Screaming Jay Hawkins não teve mais de cinquenta e poucos rebentos. São pessoas que querem descredibilizar os blues. É por isso que ninguém vai aos estádios.
Voltemos a Screaming Jay Hawkins. Era um homem que gostava de se apresentar vestido de leopardo, com ossos a atravessarem-lhe o nariz. Ficou muito conhecido com “I Put a Spell on You” e com aquela música cujo tema é a prisão de ventre e o trânsito intestinal, chamada Constipation Blues (actuava com uma retrete no palco. Não estou a brincar). E também tinha esta particularidade a ter em conta: fazia, com as suas imensas cordas vocais, um ruído bizarro – perdoe-me o estrangeirismo, mas não encontro o portuguesismo necessário –, que era como um porco na matança, mas na nota certa.
Como não existem lendas vivas dos blues que não tenham morrido já, Screaming Jay Hawkins deu-se por falecido no ano 2000. Cerca de setenta anos depois de ter nascido.

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